Insinuo um poema:
É arte aquilo que dá prazer, universalmente, sem conceito.
É arte aquilo que alguém designa como tal – que outros assim aceitam, ou não – que dá prazer, universalmente, sem conceito.
É arte aquilo que alguém designa como tal – que outros assim aceitam, ou não – que dá prazer, ou desprazer, universalmente, sem conceito.
É arte aquilo que alguém designa como tal – que outros assim aceitam, ou não – que dá prazer, ou desprazer, universalmente (de um universal simbólico), sem conceito.
É arte aquilo que alguém designa como tal – que outros assim aceitam, ou não – que dá prazer, ou desprazer, universalmente (de um universal simbólico), sem conceito, instalando um mundo ímpar, um possível do real.
Acredito na experiência estética. No entanto, eu ressalto que quando penso em experiência estética, registro a ideia de uma ciência específica para o conhecimento sensível. Logo, a experiência estética se dá antes que se estabeleça uma relação entre o eu e o mundo; ela é a relação do eu com a obra (de arte). Há um momento do gozo/fruição, no qual o prazer vem antes da discussão da obra de arte. Ser arte: imersão em prazer. Nem toda arte atinge, nem toda arte é prazer ou desprazer.
Adentrando na necessidade de escrever sobre arte, faço uma advertência: para se falar de arte (e escrever é uma espécie de fala) necessita-se fazer arte. Uma obra artística (plástica, visual ou textual) é texto de prazer. Se para falarmos sobre uma obra de arte é preciso fazer outra obra, paro e revejo o que estou fazendo…Há uma arquitetura-arte-texto de prazer? Deixo em aberto…
Designar a arte
No entanto, reflito sobre a questão do designar a arte. Geralmente, a arte seria algo designado por um artista, um crítico, um conhecedor de arte, alguém que possui o aval de uma instituição atística. Ao contrário, se não há nenhum designio, se não há palavra, a coisa permanece coisa, apenas objeto natural, o simplesmente dado pela natureza ou o criado pela natureza humana. Assim, sem intuito de ser arte só existe o feito. Posso, então, não designar minha arquitetura como obra artística, não dando a ele a intenção de ser arte, transformando-a (ou deixando-a permanecer) em algo “apenas feito”. De repente, este “apenas feito” não gera uma experiência estética, e, consequentemente, não me comprometo. Talvez, com análises desta envergadura, possamos nos confrontar com objetos de arte “por aí”. E se já estivermos habituados a procurar prazer em nossa análise do ambiente cotidiano, podemos, quem sabe, apreender a arte que insiste em se mostrar.
Inclino-me em direção à arte contemporânea e proponho compreeder a prática artística como um campo fértil de experimentações sociais, como um espaço parcialmente poupado à uniformização dos comportamentos. Sugiro aprender a habitar melhor o mundo, em vez de tentar construí-lo a partir de uma ideia preconcebida da evolução histórica. Isto significa dizer que as obras já não perseguem a meta de formar realidades imaginárias ou utópicas. As obras de arte procuram construir modos de existência ou modelos de ação dentro da realidade existente, qualquer que seja a escala escolhida pelo artista.
Situo a possibilidade de uma arte relacional. A arte relacional atesta uma inversão radical dos objetivos estéticos, culturais e políticos postulados pela arte moderna, trazendo uma mudança da função e do modo de apresentação das obras mostrando uma “urbanização” crescente da experiência artística. A arte relacional faz desaparecer sob nosso olhar a disposição das obras de arte ligada ao sentimento de adquirir um território. A obra de arte já não é mais um espaço a ser percorrido (como um museu cheio de quadros, por exemplo). Agora ela se apresenta como uma duração a ser experimentada, como uma abertura para discussão ilimitada.
O que isto nos instala?
Um regime de encontro casual intensivo criando práticas artísticas correspondentes. É uma forma de arte cujo substrato é dado pela intersubjetividade. O tema central da arte relacional é o estar junto, é o encontro do observador com o observado (a obra de arte). Temos, assim, elaboração coletiva do sentido, estreitando o espaço das relações. Temos a proposição dos “estados de encontro fortuito”. Coloco que neste quesito, parece se configurar uma espécie de relação underground ao nosso contexto social tão restritivo.
Está em pauta, aqui, o jogo das interações humanas, no qual a forma assume sua consistência, nascendo de uma negociação inteligível entre sujeitos. Na invenção destas relações entre sujeitos; cada obra de arte (ou de arquitetura) seria a proposta de habitar um mundo em comum, enquanto o trabalho comporia um feixe de relações com o mundo, que geraria outras relações, e assim por diante, até o infinito.
Diante de uma obra de arte (e de arquitetura), o corpo do espectador é trazido em sua totalidade, bem como toda sua história e seu comportamento. Não se trata apenas de uma simples presença física abstrata. Daí, o critério de coexistência. Toda obra de arte (e de arquitetura) produz um modelo de socialidade, que transpõe o real ou poderia se traduzir no real. Portanto, há uma pergunta que cabe fazer a qualquer produção estética: esta obra me autoriza o diálogo? Eu poderia, e de que forma, existir no espaço que ela define?
Leia aqui os artigos de Rodrigo Gonçalves
Insinuo um derradeiro poema:
A arte é comunicação não-liguística, voz do corpo e cor do grito.
É criar o outro discurso, a des-ordem do grito.
Grito do ser humano. Significações incertas. A indeterminação é desejada.
É uma busca dos entremeios, um criar gambiarras.
Desvelar o outro no mundo, o mais real que a realidade, sem conceito.
A essência da arte (e da arquitetura) é a poesia? A essência da poesia é a instauração da verdade? Uma semelhança entre arte, arquitetura e poesia: um devir, um acontecer da verdade. Num poema há poesia. A poesia é o momento da linguagem no qual o finito é aberto para o infinito. É difícil falar (escrever) sobre arte (e arquitetura) utilizando a linguagem que usamos no cotidiano. Esta linguagem está envelhecida, às vezes, sem vida. O que nos falam a arte, a arquitetura e a poesia? A forma mesma de um ser no mundo: só.
A poesia seria a obra suprema da produção humana?