A Bienal de Design de Londres apresenta uma coleção de ideias inspiradas pelo tema “Utopia by Design”. Nas melhores ideias da Bienal, o tema aterrisa principalmente na motivação para a mudança e transformação, focadas em igualdade social, planejamento urbano, sustentabilidade e cultura. A visão sobre utopia aparece na forma de incentivo à criatividade, que empodera designers, artistas e arquitetos a pensar um mundo melhor, coletivamente. São ideias que muitas vezes tratam de questões mundiais, que se aplicam a múltiplas culturas, mesmo quando pensadas a partir de uma questão ou tradição local.
Os 37 países analisam distopias e paradigmas para dissecar sistemas existentes, e também imaginar e inventar novos sistemas. Na maioria das instalações, a principal mensagem que a Bienal traz é ver o conceito de utopia como um exercício criativo de soluções possíveis para o nosso mundo, em toda a sua multiplicidade. A utopia se afasta do estereótipo de um idealismo sem esperanças, e se aproxima de uma celebração da criatividade. Nela, há uma aposta de que a criatividade é a catalisadora da transformação.
Pode-se identificar esse foco na transformação nas questões recorrentes das instalações: homenagens a movimentos históricos relacionados à utopia (ou utopias fracassadas), objetos simbólicos, questões de igualdade social, visualização de dados e planejamento urbano (a cidade do futuro). Duas das viagens urbanísticas são a instalação sobre Shenzen, na China, que mostra conjuntos auto-suficientes como solução para os problemas de falta de espaço na megalópole, e a vídeo-instalação da França sobre a questão atual dos refugiados da Síria. A questão da migração também foi uma das principais motivações do projeto apresentado pelo México, razão principal da minha ida à Bienal. Como diretora de criação da SuperUber, fui convidada a desenvolver uma sala imersiva para explicar o conceito da “Border City” (literalmente “Cidade de Fronteira”), cidade binacional criada pelo escritório de arquitetura mexicano FR-EE (Fernando Romero Enterprise), pensada para acomodar um aumento rápido da população e abordar a questão da migração na fronteira do México com os EUA, aplicada mais especificamente às adjacências das cidades de El Paso (Texas, EUA) e Ciudad Juarez (Mexico). No centro da sala, uma maquete de 3 metros de diâmetro da cidade “utópica” tem projeção mapeada e é cercada por animações 360º, todas sincronizadas e com voz, falando sobre os diversos aspectos do projeto – social, politico, econômico e cultural. A sala imersiva traz uma narrativa complexa, com visualização de dados sobre infraestrutura, favelas, uso de energia sustentável, comércio, indústria, transporte e crescimento urbano. O visitante sai com a impressão de que não absorveu tudo, mas sabendo quais são os principais aspectos que influenciam a realização de um projeto de cidade do futuro, aplicado a uma região real, com problemas reais, numa fronteira conflituosa e controversa.
Se traçarmos uma linha indo dos projetos mais cerebrais da Bienal para os mais metafóricos, a sala do México ficaria mais próxima dos cerebrais. Apesar de uma possível realização dessa ideia ser algo demorado e impreciso, o conceito é detalhadamente embasado na realidade. Do lado oposto da linha, dentre os metafóricos/simbólicos, está a sala dos delicados e bem humorados objetos e desenhos do artista Yasuhiro Suzuki, representando o Japão, como por exemplo recortes das ilhas japonesas flutuando num copo d’água, e carimbos que prometem o oposto do que carimbam.
Também em destaque – ganhou a medalha da Utopia dada pela própria Bienal, dois dias após a abertura – está a exposição da Rússia, chamada “Descobrindo Utopia: Arquivos Perdidos do Design Soviético”. Ela conta a história de uma utopia comunista, com uma linda sala de backlights de imagens inéditas do Museu de Design de Moscou, formando um mosaico de fotos e desenhos icônicos, repletos de significado.
Após uma longa visita, as melhores ideias compartilhadas na Bienal de Londres são as que têm o poder de inspirar e encantar. Ideias que assumem que um futuro melhor é possível, construído um passo de cada vez.
Artigo exclusivo da Diretora de Criação SuperUber Liana Brazil.