Desde que tive a experiência de frequentar a RISD, como bolsista Fulbright, na década de 1980, tive a certeza de que o conhecimento recebido deveria ser compartilhado, repassado. Nos dias atuais, com as redes sociais fazendo parte da vida de uma parcela enorme da população, o verbo compartilhar ficou um tanto desgastado… Mas quando decidi que o tesouro recebido era grande e precioso demais para ficar restrito a mim, o fiz por um sentimento genuíno de gratidão. Ao retornar ao Brasil, ainda levei um bom tempo até estar pronta para levar adiante minha intenção.
Afinal, não tinha até ali nenhuma experiência em atividade didática, pedagógica ou acadêmica. Hoje, são 25 anos ministrando cursos, workshops, oficinas e palestras pelo país afora, além de uma experiência na Colômbia. Qual é o resultado dessa iniciativa?
É sobre isso que quero discorrer neste artigo.
Voltei dos EUA em janeiro de 1987 falando de design de superfície, surface design, terminologia que ouvi pela primeira vez lá na faculdade. As reações aqui eram variadas, a maioria das vezes em um tom jocoso, principalmente por parte dos profissionais da área. Na época, o design se definia em três principais áreas ou segmentos: produto, gráfico e embalagem. O que ficasse fora disso era descartado, porque soava cosmético.
Vez ou outra eu chegava a questionar: e o design têxtil, tão aceito e compreendido, encaixa-se onde? Um tapete ou uma manta é um produto, mas e quando é uma estampa? É arte ou design gráfico?! A mim parecia ser tão claro que o design de superfície funciona como um grande guarda-chuva, onde cabem as várias possibilidades de design têxtil (estamparia, tecelagem, malharia, bordados etc. etc.), de design cerâmico (revestimentos, louças, utilitários), de revestimentos de vinil, papéis e outros materiais, e assim por diante. Ficava difícil entender as dúvidas que surgiam.
É interessante ressaltar que quando comecei a ministrar meus workshops estávamos ainda em “modo analógico”, ou seja, as ferramentas digitais eram apenas sonhos de poucos, pouquíssimos. Então, o design de superfície tinha um alcance menor e mais tradicional: restringia-se ao têxtil, aos papéis e plásticos estampados, à indústria cerâmica e vidros. Portanto, pode-se resumir as linguagens estéticas que se via no mercado em duas: a) uma super bem elaborada, bem resolvida e até sofisticada, e b) outra, bem primitiva, bem simples.
Havia os profissionais com conhecimento técnico e artístico elaborado que trabalhavam principalmente na área de estamparia têxtil ou cerâmica, enquanto que em áreas onde atualmente se explora bastante a superfície, como na publicidade ou no design gráfico, quase não se via nenhuma expressão. As superfícies eram bem menos exploradas, quase todas lisas e sem cor (cor também é trabalho de superfície).
Era como se as áreas distintas tivessem uma barreira separando-as radicalmente: ou era um projeto de superfície “decorada”, como os tecidos e porcelanas, ou era design gráfico e publicidade. Então, era bem raro um projeto gráfico ter trabalho complementar na sua superfície. Cartazes, embalagens e material de informação e comunicação normalmente continham poucos elementos e cores, ficavam mais restritos a signos, letras e números.
No início da década de 1990, fui convidada pela PUC-RS para ministrar uma oficina de design de superfície para profissionais de embalagem. A procura foi muito significativa, o que comprova que era algo incomum. A mudança se deu em razão de diferentes fatores, e penso que o principal é aquilo que a tecnologia disponibiliza, favorecendo cada vez mais a exploração de texturas, cores e efeitos. Mas então vem a pergunta que não quer calar: estamos vivendo uma época de superfícies “over”? Ou apenas é a fase do deslumbramento frente a uma nova descoberta? Há a necessidade de tanta informação visual? Como saber o que é demais e o que é de Quando estou na situação de repassar meu conhecimento, na condição de ministrante de uma oficina ou de palestrante (quase sempre em encontros acadêmicos), friso a importância de uma boa bagagem cultural no repertório do designer. É fundamental que o futuro profissional tenha conhecimento da história do design, do seu papel nesse cenário e que seja um constante questionador. Penso ser fundamental se criar encontros de discussão durante os cursos para que todos – e cada um – sejam curiosos e interessados, elevando sempre o nível do nosso design.