Matéria publicada originalmente no Archtrends, reeditada pela jornalista Simone Bobsin para o Portal.
Um novo prédio para um novo tempo. Um tempo em que o ativo mais importante está na relação do homem com a natureza, neste encontro espontâneo e cotidiano que estimula a observação e a contemplação. A obra da Associação do Pessoal da Caixa Econômica Federal (APCEF-SC), no balneário de Jurerê, mostra que esses valores foram a maior ousadia do projeto, junto com o projeto rigoroso da arquitetura, que explora o geometrismo modernista. Ousadia que considerou quatro premissas essenciais: implantação transversal ao mar, privilegiando a orientação solar e a vista; relação com o entorno existente; conforto térmico; e flexibilidade de uso dos alojamentos considerando a mudança de comportamento do usuário. As escolhas de projeto levaram o escritório Pimont Arquitetura a vencer a concorrência para o projeto dos alojamentos da APCEF-SC e ser selecionado para participar da XXII Bienal Pan-Americana de Arquitetura de Quito 2020.
“Vencemos a concorrência com a proposta de implantação do prédio integrado à praça central e a preservação da vegetação existente”, reforça o arquiteto Henrique Pimont, autor do projeto. Sua ideia levou a melhor solução ao cliente, atendendo a necessidade de 32 unidades de hospedagem com vaga para carro. A obra tem 3.297 m² de área construída e foi executada de julho de 2018 a dezembro de 2019.
Para ficar alojado nas antigas 28 unidades disponíveis da APCEF a fila era até 4 anos. A instituição atende todo o Brasil e a sede de Jurerê é a das mais disputadas do país. O cliente solicitou novos alojamentos a serem implantados onde havia uma quadra polivalente, subutilizada.
Pimont conta que, segundo uma “lenda urbana”, o projeto original da primeira sede da APCEF foi feito a partir de croqui do arquiteto Oscar Niemeyer, autor do primeiro plano de urbanização de Jurerê, na década de 1960. O segundo prédio foi edificado nos anos de 1980.
Expressão dos materiais
A expressão dos materiais explorada no desenho da volumetria é outro fator audacioso do projeto e que causa impacto na região. Pimont brinca com os recursos que o material propõe, sugere brasilidade ao projeto utilizando floreiras em concreto aparente em contraposição à marcação irregular dos montantes de madeira que marcam a composição modular como elemento básico da edificação.
No térreo, a presença das garagens é filtrada pelos montantes de madeira que ocupam toda a altura do pavimento, proporcionando um fechamento ventilado que ameniza o contato com o estacionamento. A praça principal da associação se estende pelo vão entre os blocos, subindo por uma “arquibancada vegetal”, valorizando esse espaço de convívio com infraestrutura para eventos.
“Nossa simplicidade subtropical tempera o geometrismo modernista”, conclui Pimont, cujo repertório se abastece na referência da arquitetura moderna brasileira sem, contudo, restringir-se a esta escola.
Visual para a praia
“Procuramos traduzir na arquitetura um equilíbrio entre a informalidade de uma sede balneária e a institucionalidade adequada a uma associação de servidores de um banco estatal, de forte papel social”, reforça o arquiteto, dizendo ainda que o próprio local sempre aponta uma sugestão de projeto. Ele cita o que ensina Paulo Mendes da Rocha que é “não repetir os mesmos erros”. Por essa razão, um fator decisivo foi a implantação do projeto no terreno.
Por isso, a escolha por dois blocos de apartamentos implantados de frente para o mar, virados para o norte, com a intenção de privilegiar os visuais, respeitar o ambiente existente e considerando, ainda, as condições climáticas (sol, vegetação, chuva, vento) para minimizar os impactos ambientais e reduzir o consumo energético.
“Quebrando o paradigma de implantação transversal ao mar, presente na maioria das edificações próximas, na implantação privilegiamos a orientação solar ideal para todos os apartamentos”, afirma Pimont. O resultado foi um alto nível de adequação bioclimática e eficiência energética, complementado por um layout de plantas que explorou ao máximo a ventilação natural e cruzada.
A implantação também desviou de árvores de grande porte existentes, preservou o ambiente e micro clima local e o projeto se estendeu até o espaço público, requalificando a rua de acesso à praia. Com a reorganização dos espaços de veículos, a via para os pedestres foi valorizada, além do cliente fazer o replantio da restinga junto à praia, contribuindo para a reconstituição do importante bioma.
Pode-se considerar, ainda, que outra ousadia de projeto é a proposta de circulação aberta nas escadas, proporcionando ao usuário a observação da paisagem enquanto caminha pelo prédio.
Programa proposto
O programa proposto atendeu a Associação com os 32 novos alojamentos e apontou caminho para ampliação futura. A edificação tem elevadores, sinalização tátil e apartamentos desenhados e mobiliados especialmente para utilização por pessoas com deficiência.
Os novos alojamentos, com estrutura modular, atendem a mudança no perfil das famílias, se adequando aos novos comportamentos. As antigas unidades abrigavam de 5 até 8 pessoas, tornando o espaço ocioso a cada ano. As novas se dividem entre unidades padrão para 4 pessoas, estúdios para 2 pessoas e unidades conjugadas para até 6 pessoas.
Energia Fotovoltaica
O prédio é utilizado com capacidade plena apenas no verão, com ocupação menor no restante do ano. Essa condição determinou a escolha pela instalação de chuveiros elétricos e a dispensa por um sistema central de aquecimento. Em paralelo, o arquiteto intermediou a contratação de um sistema de energia fotovoltaica e uma usina privada foi instalada na cobertura, com financiamento de longo prazo. “Incorporamos tecnologia de energia renovável, permitindo economia de tubulações e de sistemas que ficariam subutilizados e exigiriam maior manutenção”, avalia.
O resultado, segundo o arquiteto, foi a construção de um edifício com qualidade e orçamento baixo, dentro das capacidades de investimento da Associação, sem qualquer comprometimento da sua capacidade financeira.
Ficha Técnica
Nome do projeto: Apcef-SC – Conjunto de apartamentos para a Associação do Pessoal da Caixa Economica Federal – Residencial
Escritório: Pimont Arquitetura – Escritório Pimont Arquitetura, arquitetos Henrique Pimont e Alejandro Ortiz.
Área construída: 3.297,70m2
Localização: Balneário de Jurerê, Florianópolis
Ano: execução de julho de 2018 a dezembro de 2019 – EPC Engenharia
Fotos: Fernando Willadino, Angelo Mincache, Pedro Caetano e arquivo/Pimont Arquitetura.