A sustentabilidade possui diferentes definições, que dependem do ponto de vista e da área em que está sendo aplicada. De forma geral, sustentabilidade é a capacidade de usar os recursos naturais para suprir as necessidades atuais sem comprometer as necessidades das gerações futuras. Ou seja, é o equilíbrio entre o uso de recursos e sua renovação. Neste sentido, estamos em débito com o meio ambiente e a indústria da construção civil tem papel expressivo nesse campo.
Estima-se que na década de 70 ultrapassamos os limites planetários e estamos usando mais recursos do que a natureza é capaz de regenerar. Precisaríamos hoje de 1,7 planetas para aguentar nosso padrão de consumo, número esse que sobe para 5 caso estivéssemos falando de países desenvolvidos, como os Estados Unidos.
A construção civil tem papel expressivo quando o assunto é geração de resíduos e poluição. Em 2019 no Brasil, a indústria foi responsável por aproximadamente 50% dos resíduos sólidos coletados e por 40% de toda a emissão de carbono. Estima-se que desses resíduos coletados, 95% têm potencial de reciclagem, porém apenas um quinto do total é reciclado.
No que tange a emissão de gases, é considerado todo o ciclo de vida da indústria – desde a extração de matéria prima, passando pela construção em si, uso e manutenção das edificações, até o fim do seu ciclo de vida – a escolha correta de insumos, métodos construtivos, técnicas de reaproveitamento de recursos e fonte energética, pode reduzir em, pelo menos, 35% a emissão de carbono.
Economia circular
A produção de resíduos é inevitável para a indústria da construção. A economia atualmente está fortemente pautada no modelo linear, onde segue o padrão: extração, manufatura, distribuição, consumo e descarte. Sendo o final da cadeia produtiva o lixo. Repensar a forma como esses resíduos são descartados e como podem ser reintroduzidos na cadeia de produção é uma das formas de diminuir o impacto ecológico e transformar o que era lixo em matéria-prima para a produção de insumos.
A economia circular, conceito introduzido em 1989 pelos ambientalistas britânicos David Pearce e Kerry Turner, propõe uma mudança nos padrões de produções atuais, quebrando a linearidade e introduzindo um ciclo, onde o final da cadeia, que é o descarte de materiais, retorna para o início como matéria-prima para a produção de insumos. Para a construção civil, a economia circular coloca os resíduos e lixos de demolição, por exemplo, de volta na cadeia produtiva.
Na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2021, também conhecida como COP26, evento que ocorreu em Glasgow, no Reino Unido, as metas definidas para a construção civil são arrojadas no que diz respeito à neutralidade de emissões de carbono. Pretende-se até 2050 zerar as emissões, tanto para novas edificações quanto para as existentes. As ações para alcançar tal objetivo envolvem mudanças sistemáticas.
Essas mudanças trazem a atenção de todos os profissionais da área sobre dois dos insumos mais utilizados atualmente: o aço e o cimento. Devido aos seus processos de produção com alto consumo energético e alta emissão de carbono, as indústrias responsáveis pela produção dos mesmos precisarão de inovação para cumprir as metas estabelecidas no acordo climático e fazerem frente a tecnologias novas e disruptivas que surgem para o setor, como construções a seco, materiais com melhor eficiência, casas inteligentes, reaproveitamento de recursos, entre muitas outras tecnologias já disponíveis.
O retrofit, que é o processo de restauro de edificações existentes, com a introdução de novas tecnologias e adequação à legislação vigente, ressignificando a edificação para atender a novos usos e demandas, é uma das formas de introduzir os conceitos de sustentabilidade aliados à economia circular. Uma vez construída, uma edificação possui em si o que é caracterizada pelo historiador da arquitetura Kiel Moe como energia incorporada. Que é o somatório de toda energia acumulada no ciclo de vida dos materiais, desde a extração até o descarte.
Ao ressignificar uma edificação, introduz-se a ela tecnologias que aumentam sua eficiência, diminuem o consumo energético requerido para seu funcionamento, produzem uma menor pegada ecológica – metodologia que avalia a pressão de consumo dos recursos naturais – e geram economia financeira a médio e longo prazos. Além de reaproveitar parte dessa energia acumulada dos materiais e economizar o gasto energético requerido para produção de novos componentes.
É importante que os ideais ambientais da indústria estejam alinhados com suas ações, para não entrar no campo do greenwashing – que é apropriação indevida do termo sustentabilidade, usando-o como discurso de promoção, porém sem medidas reais que beneficiam a causa. A indústria da construção, hoje a vilã no que diz respeito a questões ambientais, tem a capacidade de alcançar a vanguarda da sustentabilidade, desde que haja uma conscientização de toda a classe, empresas, profissionais, governo e consumidores finais. E que a agenda de sustentabilidade seja tão forte quanto a agenda econômica.
Márcio Fonseca, Engenheiro Civil formado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC/2018). Realizou intercâmbio acadêmico na Budapest University of Technology and Economics (BME) em 2014, onde cursou dois semestres regulares de Civil Engineering e participou do Brazilian Structural Engineering Student’s Scientific Conference, com a pesquisa científica Restoration Techniques Comparison Between Brazil and Hungary. Além das atribuições regulares, possui habilitação em projeto e planejamento de aeroportos, patologia das construções e avaliações de imóveis urbanos. Atualmente cursa MBA em Gestão de Projetos pela USP/Esalq e é gerente de projetos na Tonin Fonseca.