Arte menor? Arte mais barata e acessível? Um armazém ou uma galeria? Essas são algumas das perguntas levantadas pelo espectador que se depara com a exposição e feira de arte “O Mundo como Armazém”, uma das três exposições realizadas pelo Museu de Arte de Santa Catarina (Masc), no Centro Integrado de Cultura (CIC), em Florianópolis (SC), para marcar os 70 anos da instituição. Os cerca de 400 artistas e 700 trabalhos estão expostos, até 9 de junho, no espaço anexo à sala Lindolf Bell. Entre selecionados, convidados e obras do acervo, a mostra se propõe investigar questões e relações entre publicação de artista, o múltiplo, arquivo e coleção. A iniciativa está legitimada pelo Prêmio Edital Elisabete Anderle 2017 e integra o projeto expositivo de extensão do Masc.
Idealizado como um grande encontro entre artistas/coletivos/editoras independentes e público, a mostra/feira reúne obras de arte que sejam múltiplos, aquelas produzidas em número ilimitado, mediante diferentes processos industriais ou não como publicações de artista, livros de artista, cadernos de artista, cadernos de desenho, diários de artista, diários de bordo, postais, panfletos, cartazes, gravuras, fanzines, lambe-lambes, stickers, cartões, carimbos, objetos, etc. As tiragens são diferenciadas entre pequenas e grandes edições.
Um múltiplo, de acordo com definição do artista e pesquisador Jayro Schmidt, autor do livro “Movimentos e Significados nas Arttes Plásticas” (Bernúncia Editora/2007), é a reprodutibilidade de obras, a multiplicação de um original. “O artista imbuído de senso construtivo da forma, ao pensar o múltiplo, transforma suas ideias em protótipos”. Por não ser uma peça única, o preço se torna mais acessível.
A partir desse recorte, Armazém abarca múltiplas possibilidades. O espectador precisa de tempo para compreender a dimensão e o valor extraordinário de certos achados. No seu conjunto, o acervo equivale a uma caixa de surpresas. Tudo misturado, trabalhos de Alexandre Siqueira, Lasar Segal (1891-1957), Helio Oiticica (1937-1980), Cildo Meireles, Arnaldo Antunes, só para citar uns grandes do cenário brasileiro, podem estar ao lado de obras de artistas iniciantes. Ou, quem sabe, assim pertinho de um livro de John Cage (1912-1992), uma obra de Yoko Ono e até de Joseph Beuys (1921-1986)?
A exposição se desdobra em duas salas, a menor agrupa o acervo do Armazém, constituído de nomes nacionais e internacionais, e artistas convidados e selecionados. Juntos, as cerca de 400 representações resultam num panorama abrangente. Sem hierarquias, a montagem adota critérios diferenciados a cada edição. Lugar do artista no sistema de arte, importante ou iniciante, sua origem, não importa. Armazém é regido por um plano de igualdade e cabe ao público fazer suas descobertas e curtir as grandes surpresas. Pelo volume de trabalhos, é recomendável ir com tempo, porque a mostra é envolvente, convida ao mergulho, à atenta observação. Só para dar algumas dicas, é possível se deparar com obras de Leonilson (1957-1993), Rosângela Rennó, Guto Lacaz, William Kentridge, Kazuo Ono, entre outros.
O certo é que o espectador deve evitar a cilada do preconceito. O fato de ser um múltiplo não desqualifica a criação. Ao contrário, ela se materializa de modo expandido nas relações contemporâneas da arte com o mercado e, sobretudo, com o interesse de tornar o produto artístico mais acessível. Na sua narrativa não hegemônica, o Armazém é provocador e dá amplitude para o seu projeto que também convida a mexer em livros e objetos.
No âmbito de Santa Catarina, as representações se alargam a partir da Capital, abarcando nomes como Cyntia Werner, Sérgio Adriano H, Sandra Cecruski, Editora Micronotas, da região Norte, Joinville; Daniela Zacarão e Odete Calderam, da região Sul, de Criciúma; Diana Chiodelli, Janaína Schvambach e Audrian Cassanelli, do Extremo-oeste, de Chapecó; Márcia Cardeal, de Brusque; Kim Coimbra e Sarah Uriarte, de Itajaí.
A décima sexta edição do Armazém prevê também um seminário sobre o tema múltiplo e publicação de artista, em parceria com o Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc). Nos dias 8 e 9 de junho, a iniciativa finalizará com um grande feira/encontro entre artistas/coletivos/editoras e público.
- por Néri Pedroso, especial para o portal ArqSC
Sobre o Armazém:
Criado em 2011, o projeto Armazém apresenta, através de exposições e feiras de arte, obras que sejam múltiplos como publicações de artista, livros de artista, cadernos de artista, cadernos de desenho, diários de artista, diários de bordo, postais, panfletos, cartazes, gravuras, fanzines, lambe-lambes, stickers, cartões, carimbos, objetos, etc; ou seja, trabalhos que tenham tiragens. Três fatores dão título ao projeto: a primeira edição aconteceu em Florianópolis (SC), no Museu Victor Meirelles, instalado na casa natal de Victor Meirelles na qual funcionou um bar e armazém durante parte da primeira metade do século 20. Além das relações com o espaço físico da instituição, a edição inaugural referencia o grupo Fluxus e o texto de Arthur C. Danto, “O Mundo como Armazém: Fluxus e Filosofia”, no livro “O que é Fluxus? O que Não É! O Porquê”, publicado em 2002 pelo Centro Cultural do Banco do Brasil/The Gilbert an Lila Silverman Collection Foundation.
Outro fator inspirador é a imagem utilizada nos cartazes das edições, uma fotografia de acervo familiar da idealizadora do projeto, Juliana Crispe. Um retrato do seu bisavô, Osvaldo Manoel Valgas, conhecido como seu Vadico, que entre as décadas de 1930 e 1990 foi sócio/funcionário de um armazém, no bairro Prainha, próximo ao centro da cidade de Florianópolis.
Desde 2011, o Armazém contabiliza a participação de mais de 300 artistas/coletivos brasileiros e alguns estrangeiros. Ao longo desses anos, formou um acervo de trabalhos com mais de mil obras em sua coleção.
Armazém é um espaço propositor de relações com a arte. Nas últimas edições, um ou mais curadores são convidados a participar da seleção de artistas e obras. A ideia é compartilhar olhares diferenciados e aproximar artistas locais por onde o projeto transita com os já participantes.
Armazém propõe um jogo relacional, propicia experimentar o contato direto com os trabalhos, tocando, lendo, trocando impressões e sensações. A coleção e as mostras se dão num conjunto heterogêneo e desprendido de hierarquias, valoriza o múltiplo e o coletivo como força pulsante e necessária para as artes.
Equipe técnica
Proponente: Juliana Crispe
Produção executiva: Francine Goudel
Assistência de produção: Franciele Favero
Organização: Fran Favero, Francine Goudel, Juliana Crispe e Raquel Stolf
Equipe e conselho curatorial: Daniela Avelar, Duda Desrosiers, Fran Favero, Francine Goudel, Joana Amarante, Julia Amaral, Juliana Crispe, Michal Kirschbaum, Raquel Stolf, Patrícia Galelli e Silfarlem Oliveira
Curadoria educativa: Andressa Argenta, Isadora Stähelin e Juliana Crispe
Ação educativa: Andressa Argenta, Fabio Luis, Isadora Stähelin, Joana Amarante, João Lazaro, Kátia Speck e Mia Rodrigues
Montagem: Andressa Argenta, Anna Moraes, Betania Silveira, Carolina Favero, Daniela Avelar, Diego de los Campos, Elaine Schmidlin, Fabio Luis, Fran Fravero, Francine Goudel, Franzoi, Joana Amarante, Juliana Crispe, Juliana Hoffmann, Kellyn Batistela, Luciana Petrelli, Michal Kirschbaum, Rodrigo Sambaqui, Sandra Correira Favero e Silfarlem Oliveira
Conservação, preservação e catalogação do acervo: Sandra Checruski
Assistente de catalogação do acervo: Joana Amarante
Fotografias: Duda Desrosiers e Rodrigo Sambaqui
Designer gráfica: Tina Merz
Assessoria de imprensa: Néri Pedroso
Realização:
Projeto Armazém, Museu de Arte de Santa Catarina (Masc), Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais/Udesc
Produção:
Lugar Específico
Apoio:
Edital Elisabete Anderle de Estímulo à Cultura 2017, Funcultural, Fundação Catarinense de Cultura e Governo do Estado de Santa Catarina
Apoio Cultural:
Departamento de Artes Visuais Ceart/Udesc, Espaço Cultural Armazém – Coletivo Elza, Farmácia Ponta do Goulart e Multicor Fine Art
Serviço:
O quê: 16º Armazém, projeto contemplado pelo Edital Elisabete Anderle de Estímulo à Cultura-2017
Quando: Até 9 de junho de 2018, 13h às 21h
Onde: Museu de Arte de Santa Catarina – anexo Sala Lindolf Bell, Centro Integrado de Cultura, av. Gov. Irineu Bornhausen, 5.600, Agronômica, Florianópolis (SC), tel.: tel.: 3664-2555
Quanto: Gratuito
Feira e Seminário: 8 e 9 de junho de 2018, 9h às 21h.