O arquiteto Marcelo Salum é um dos destaques da mostra Artefacto 2025, aberta no Square SC, na rodovia SC-401, na capital catarinense. Com o tema “Viver com Arte”, a vitrine da loja se abre para o projeto que faz uma homenagem ao pintor, poeta e escritor Rodrigo de Haro (1939-2021), cujas pinturas e mosaicos inspiram uma casa de quarto, escritório, sala de jantar, estar e biblioteca, um pied-à-terre de artista. No dia 14 de outubro, na Artefacto, às 11h30, o Núcleo Colaborativo de Arquitetura e Design (NCD) promove um encontro de diálogo com o arquiteto e a professora doutora Sandra Makowiecky. Sob a mediação da publisher da plataforma ArqSC, jornalista Simone Bobsin, ambos compartilham experiências e conhecimento, ajudando a situar o papel das coleções de obras de arte.
Como mediadora, Bobsin antecipa sua compreensão sobre Salum, que conhece há cerca de 20 anos, desde o seu primeiro escritório de arquitetura com Flávia Guglielmi. A jornalista lembra algo dito por ele certa vez em uma palestra: “Repertório é sobre o que nos toca”, justo o que o tornou, segundo ela, uma referência nacional de autenticidade, associado ao fato de que assume o conhecimento e confia em suas escolhas.
O que realmente faz de Salum um ponto fora da mesmice em que se tornou grande parte da arquitetura de interiores é a coragem de assumir seu ponto de vista, construindo um repertório cultural próprio que une música, literatura, muita cor, sabor, afeto, proporção áurea e até as cinco peles de Hundertwasser, por exemplo
“Jovem recém-formado, era natural a ansiedade em mostrar o trabalho. Em uma das mostras de decoração das quais participou, fez questão de se apresentar e insistir na publicação do projeto no jornal em que eu era editora. Até hoje lembramos dessa história e caímos na risada. Desde então, no começo dos anos 2000, acompanho sua trajetória — da qual sou admiradora. Fã assumida, me identifico com suas ideias e estética high-low. Mas o que realmente faz de Salum um ponto fora da mesmice em que se tornou grande parte da arquitetura de interiores é a coragem de assumir seu ponto de vista, construindo um repertório cultural próprio que une música, literatura, muita cor, sabor, afeto, proporção áurea e até as cinco peles de Hundertwasser, por exemplo”, diz Bobsin.
De volta à mostra Artefacto 2025 e ao projeto de Salum: os ambientes incorporam cinco pinturas de Rodrigo de Haro, duas dos anos 1990 da série “Ilha ao Luar” e outras três dos anos 1970, todas pertencentes à Coleção Collaço Paulo. Em diálogo, duas cerâmicas de Sara Ramos, também artista de Santa Catarina e dona de um expressivo currículo de exposições individuais e coletivas. “Eu também Venho dos Trópicos” e “Amazônia” são trabalhos recentes, da série Engolidores, criados neste ano sem conexão antecipada com a mostra em Santa Catarina.
Para captar o seu amplo repertório, antes de tudo é recomendável na visitação guardar anseios minimalistas e monocromáticos para se deter nos detalhes, reveladores da envergadura da pesquisa de cor e objetos, de texturas, grafias, observar os móveis e os livros pertencentes ao espólio de Rodrigo de Haro como bengalas, gravatas, livros, chapéu, um quimono, estátua, vaso, um pote de pinceis, materiais que ajudam a compor uma ideia do modo de viver do artista e instauram uma ambientação toda especial.
Nesta entrevista, Salum antecipa um pouco do pensamento condutor do projeto apresentado, demonstra como atua no eixo Florianópolis–São Paulo, aproveitando o acesso a museus, galerias e feiras. “Aos poucos, tenho construído um repertório pessoal que reverbera em minhas escolhas e me torna mais assertivo ao auxiliar meus clientes”, afirma ele, que destaca o poder da arte “de emocionar, de trazer à tona sentimentos profundos”, certo de que a arquitetura também pode ser vista como uma forma de arte.

OUTRAS MATÉRIAS COM MARCELO SALUM
Arte e arquitetura, arte e design de interiores – é possível dissociar?
Marcelo Salum – Acredito profundamente que a emoção é uma porta de entrada tanto para o nosso interior metafórico quanto para o físico. Nesse sentido, é impossível dissociar essas dimensões. A arte tem o incrível poder de emocionar, de trazer à tona sentimentos profundos. A arquitetura, por sua vez, também pode ser vista como uma forma de arte, e ao longo da história da civilização temos exemplos poderosos que comprovam isso. O interior de um espaço faz parte desse universo, estabelecendo uma conexão direta e até íntima com quem o habita. Nesse contexto, a arte, seja dentro ou fora de um espaço, tem como função primordial emocionar, mas também desempenha um papel essencial ao contar histórias e transmitir narrativas.
Compreender a importância da arte em um espaço significa incorporá-la desde o início do processo projetual. Isso vale tanto para um cliente que já tem um acervo quanto para aquele que deseja começar a adquirir obras de arte.
Qual o papel da arte na trajetória de um arquiteto bem-sucedido?
Salum – Compreender a importância da arte em um espaço significa incorporá-la desde o início do processo projetual. Isso vale tanto para um cliente que já tem um acervo quanto para aquele que deseja começar a adquirir obras de arte. Como mencionei anteriormente, a arte tem o poder de contar histórias — a história de uma família, seus gostos, suas emoções. Entender essa dimensão de forma íntima é essencial para criar uma relação viva e verdadeira entre o espaço habitado e as artes que o compõem. Em nossos projetos, a arte nunca ocupa um lugar secundário, mas sim de destaque. Gosto de fazer uma analogia com a moda: uma roupa bem escolhida ganha um novo significado com o acessório certo. Da mesma forma, na arquitetura e nos interiores, a arte tem o papel de valorizar o ambiente e contribuir para que ele atinja todo o seu potencial. Embora eu não me considere um profundo conhecedor de arte, estar no eixo Florianópolis–São Paulo me proporciona acesso frequente a museus, galerias e feiras. Aos poucos, tenho construído um repertório pessoal que reverbera em minhas escolhas e me torna mais assertivo ao auxiliar meus clientes.
Em que momento definiu Rodrigo de Haro? Quais os fatores determinantes para a escolha do artista? Até que ponto a visita ao Instituto Collaço Paulo na ocasião da mostra “Máscara Humana” delineou seu pensamento?
Salum – Assim que recebi o convite para participar da mostra Artefacto 2025, cujo tema é “Viver com Arte”, imediatamente pensei no Rodrigo. A escolha foi natural, tanto pela grande afinidade que tenho com o trabalho dele — pelas cores, pelos temas que ele aborda e pela forma singular com que sempre se expressou —, quanto pela conexão com o briefing trazido pela loja, que fazia referência ao manifesto de Ricciotto Canudo (1877-1923) sobre as Sete Artes. Nesse contexto, Rodrigo se destaca como um artista completo e multifacetado, transitando com maestria por diversas plataformas mencionadas por Canudo. A visita à mostra no Instituto Paulo Collaço – Centro de Arte e Educação reforçou ainda mais meu desejo de homenagear esse grande artista. Embora a exposição estivesse focada em um período específico da sua trajetória, ela nos envolveu profundamente, despertando inspiração e admiração em cada detalhe.
… concebemos o espaço pensando em como o Rodrigo o habitaria. Um pied-à-terre de artista, perdido em algum lugar do Brasil ou do mundo. A ideia inicial foi permitir que as cores e formas das obras dele transbordassem para o ambiente …
Rodrigo de Haro e Sara Ramos dialogam – potente aproximação, dois artistas da cidade. Essa seria a casa de um colecionador com bom conhecimento de arte?
Salum – Na verdade, concebemos o espaço pensando em como o Rodrigo o habitaria. Um pied-à-terre de artista, perdido em algum lugar do Brasil ou do mundo. A ideia inicial foi permitir que as cores e formas das obras dele transbordassem para o ambiente, criando uma atmosfera que dialogasse com a proposta expressa em seus quadros. O trabalho da Sara trouxe uma dimensão contemporânea ao espaço, com duas esculturas deslumbrantes que evocam uma alusão ao surrealismo e às cores vibrantes que ele tão bem emprega nas suas criações.
Fomentar a cultura em um país que tantas vezes negligencia essa área é crucial para a formação das futuras gerações, e, nesse sentido, o instituto deixa um legado grandioso. Estou profundamente feliz e honrado com essa parceria!
Como foi a experiência com o Instituto Collaço Paulo, num atendimento que envolve o colecionador e a museóloga. É um diferencial ou isso resulta em dificuldades?
Salum – Os colecionadores Marcelo Collaço Paulo e Jeanine Gondin Collaço são amigos queridos. Sempre tive a oportunidade de compartilhar com o Marcelo alguns projetos que desenvolvi para mostras de decoração, e ele, como sempre, trouxe contribuições significativas para cada um deles. No caso deste projeto para a mostra Artefacto 2025, a generosidade em emprestar as obras que compõem o ambiente foi de enorme valor para o sucesso e a realização desse espaço. Além disso, sendo amigos do Rodrigo, o casal compartilhou depoimentos que enriqueceram imensamente as ferramentas e inspirações para a concepção do projeto. Todo o processo de colaboração com o instituto foi extremamente fluido, marcado por profissionalismo, respeito e gentileza. A organização impecável do instituto nos enche de orgulho e contribui significativamente para o desenvolvimento cultural da nossa cidade. Fomentar a cultura em um país que tantas vezes negligencia essa área é crucial para a formação das futuras gerações, e, nesse sentido, o instituto deixa um legado grandioso. Estou profundamente feliz e honrado com essa parceria!