“Irredutível Ruído” é a exposição da artista Letícia Cardoso que abre dia 10, às 18h, no novo espaço da Helena Fretta Galeria de Arte, em Florianópolis. A curadoria é de Thays Tonin, que compartilhou com o Portal o texto curatorial sobre a mostra.
A exposição condensa um processo artístico que iniciou por volta de sete anos atrás a partir de experiências da artista com arte-performance para o Museu Victor Meirelles, em 2015, o espaço O Sítio, em 2017, e o Sobrado na Ladeira, em 2018. Os quatro anos de pesquisa de Doutorado em Artes Visuais pela UDESC abordando as relações entre arte e psicanálise em suas pinturas e ainda os sonhos como processos de criação artística fundamentam sua produção.
O espaço expositivo será protagonista de novas experiências visuais e sensoriais aos visitantes. Além da mostra, a equipe convida os interessados a participarem do curso gratuito oferecido pela artista aos sábados (11/06, 18/06 e 25/06), sempre às 11h, acerca das relações entre Artes, Sonhos e Psicanálise.
Serviço
Dia 10/06, às 18:00h
Helena Fretta Galeria de Arte (Rua Presidente Coutinho, 532, andar inferior).
Texto Curatorial
Qual a origem dos sonhos? Quais sentidos nossas memórias criam e recriam quando sonhamos? São estas, talvez, conversas erráticas com outras versões de nós mesmos? O sonho é deriva, é rasura. É rumor que insiste em querer se fazer escutar. Leticia Cardoso se propôs então a ouvir os sonhos, a aceitar o ruído, a
escutar o caráter inesgotável do murmúrio da memória, em uma ‘conversa infinita’, como escreve Blanchot.
É daí que decorre os quase sete anos explorando seus sonhos como fonte artística, como espaço de
criação. Assim, durante sua residência artística no Sobrado na Ladeira*, Leticia se deixa ouvir não só as conversas que têm consigo mesma, mas, antes, outras memórias que a casa do século XIX salvaguardava. Entre antigas fotografias, baús de documentos e paredes rasuradas, Leticia faz surgir histórias de mulheres (reais? simbólicas?)
que habitaram o Sobrado no século XX – visto que parte de suas vidas fora vivida neste antigo Sanatório para mulheres ‘afetadas intensamente por suas paixões’. Logo, Leticia dá vida a duas personagens: a paciente Rosa e a “histeria” de seus sonhos sujos e a analista, a Ruinóloga Visual – o outro feminino performado no século XXI.
Os resultados dessas conversas consigo mesma são obras carregadas de sonhos, de histórias sendo escritas, rasuradas e reescritas. Transfigurando um novo arquivo de história da arte, estas mulheres (Letícia, Rosa, Ruinóloga) escrevem e pintam, finalmente, suas narrativas e afetações. Palavras se sobrepõem às imagens e
vice-versa, em uma exposição que nos faz ponderar acerca dos ruídos das memórias em nós. Leticia dá vida a várias personagens que apesar de separadas pelo tempo, conversam pelos sonhos. O que decorre destes diálogos é carregado deste “irredutível ruído” que se faz presente no gesto artístico, na criação.
É, portanto, adentrando este rumoroso arquivo de diferentes processos artísticos que a exposição
nos conduz, sala a sala, oferecendo a seus/suas visitantes a possibilidade de imaginar como sonharam e sonham as mulheres do século XIX, XX e XXI, e como compartilhamos, tal como um ruído ao fundo, fantasias e afetações.
*Sobrado na Ladeira é uma casa localizada na Lagoa da Conceição, em Florianópolis/SC, onde artistas são convidadas/os para propor residências artísticas.