Há poucos dias publiquei o texto “Bug do Portal: acesso e excesso de informação leva ao paradoxo das vítimas da urgência” para compartilhar um processo individual que iniciou com a pandemia, durou meses e virou uma investigação artística para desbugar – ‘qualquer dia dos 50 dias, um inventário do isolamento’. Durante este período, fiz leituras diversas, assisti conversas em diferentes plataformas, conversei com amigos, fiz cursos … Também me distanciei porque precisava de “silêncio” “para ver o perfume das coisas”. Em meio a tanta informação se faz necessário filtrar o que é relevante e o que faz sentido no agora.
Me dei conta que poderia dividir com vocês alguns caminhos que percorri para enxergar valor no que estamos fazendo até repensar a atuação do Portal e entrar em um processo de reconstrução da marca e planejamento de futuros projetos. Nesta caminhada de meses, não estou sozinha. A presença de jovens tem feito total diferença no modo de enxergar alguns processos e construir outras linguagens, reforçando nosso DNA, porém nos adaptando aos novos tempos.
Segue aqui, de forma despretensiosa, algumas de nossas escolhas.
Sociedade do Cansaço, de Byung Chu-Han – lido antes da pandemia nas aulas do Grupo de Estudos Artísticos Políticos Curatoriais, o livro do filósofo sul-coreano analisa sociedade disciplinar de Foucault e sociedade do desempenho, o hiperconsumo, a falta de consciência da dominação, as doenças a partir do comportamento nesses contextos, a carência do ser e aponta outras questões contemporâneas: a violência da positividade causando estados patológicos, a autoexploração, a falta de um estado contemplativo, a dialética da liberdade, o silêncio sufocado pelo alarido da comunicação. Tem que ler!
Já acompanhava o podcast Boa Noite Internet, com o Cris Dias, e aí ele bugou na pandemia. Foi muito bom escutá-lo falando abertamente sobre esse momento na entrevista sobre “como produzir conteúdo que inspira quando quem cria o tal conteúdo está “desinspirado” pelos rumos que o mundo está levando nessa época de Covid-19”. Ele foi perguntar para Juliana Wallauer, isso lá em abril, como ele estava fazendo para seguir publicando o Mamilos Podcast toda semana. Vale ouvir cada minuto.
Livro + clube – Empreendedorismo para subversivos
É um livro-guia não-convencional que virou um curso, depois um clube e foge ao lugar-comum dos discursos sobre empreender. Facundo Guerra é o nome por trás da ideia e criação de sua vasta comunidade e com a qual me relaciono. Ele acredita que “empreender é uma das formas que temos de contar a história de um lugar — e que o produto é a visão de mundo de quem empreende”. Parece óbvio, e é, mas necessário incorporar essa ideia para de fato ter verdade no que se faz.
E é justamente a história deste engenheiro de alimentos, jornalista, mestre e doutor em política. O empresário argentino de nascença, paulistano por escolha, como ele mesmo diz, é “autor” de 20 negócios em São Paulo, entre eles, o Vegas Club, no Baixo Augusto, os bares Volt e Riviera e as casas noturnas Lions, Yacht, Cine Joia e PanAm, Mirante 9 de Julho e o incrível Bar dos Arcos, considerado um dos mais interessantes do mundo – só pra citar alguns. Ah, e o projeto da casa flutuantes Altar. Um empresário que assume erros e acertos, seu posicionamento político e fala com franqueza sobre isso.
Se você pretende empreender, sugiro pelo menos espiar o que ele tem a dizer.
Futuros desejáveis com Lala Deheinzelin
Não lembro exatamente quando ouvi falar da Lala Deheinzelin pela primeira vez. Conheci pessoalmente em uma das edições do Social Good Brasil e só confirmei sua potência em enxergar longe, responder questões complexas do nosso tempo e apontar cenários possíveis. No início da pandemia, acompanhei a ex-atriz – ela protagonizou um dos primeiros casais homossexuais na novela brasileira, em 1988, em Vale Tudo – em suas lives de transição: “O que fazer já com quem somos e com o que temos”. A intenção era olhar para tudo o que estava acontecendo à luz de futuring e novas economias.
Ainda estou no processo de imergir nesse universo de Lala que vê o futuro com óculos 4D, ou seja, por meio da fluxonomia 4D. Ela é uma das principais especialistas mundiais em Futurismo + Novas Economias. Comprei o livro “Novas Economias Viabilizando Futuros Desejáveis” que é um dos títulos da minha mesa de cabeceira. É um longo caminho de aprendizagem que continuarei a trilhar.
Lala diz: “A vida em rede provoca tanta transformação porque tem o mesmo crescimento exponencial do coronavírus. A quantidade de informação, o endividamento, o crescimento da população, os danos ambientais multiplicaram-se rapidamente. Mas, tanto nosso corpo, quanto as 24 horas do dia e o próprio planeta permanecem lineares. Existe claramente um gap na capacidade de resposta do indivíduo e da sociedade em relação à dinâmica exponencial. Suprir essa lacuna é imprescindível”.
Se você ainda não conhece, demorou!
MAP – Método de adaptação perestroika
A dupla da Perestroika é divertida, mas fala com propriedade sobre a necessidade de adaptabilidade, sair da zona de conforto e encarar a instabilidade, a nossa nova realidade. Eles bugaram, paralisaram e compartilharam seus problemas, olharam para a sua própria história e se adequaram ao momento. Encontramos ressonância nesse discurso e assistimos algumas aulas para ouvir sobre o MAP, uma metodologia que eles criaram como resultado do cruzamento entre um artigo do Google, que apresenta as 11 forças de transformação para empresas, com o histórico da Perestroika de 13 anos de pesquisa e produção de conteúdo. Só que no centro da metodologia da Perestroika estão as pessoas.
Entre tantas coisas que eles falaram, uma delas já é bem conhecida. O acrônico VUCA que descreve as quatro características marcantes do momento em que estamos vivendo: Volatilidade, Incerteza, Complexidade e Ambiguidade.
Silêncio
Assim como nós fizemos, coloca na sua lista a prática do silêncio e da atenção profunda ao estado contemplativo para ter a chance de “ver o perfume das coisas”, como observou, certa vez, Paul Cézanne. Este trecho está descrito no livro Sociedade do Cansaço, do filósofo Byung-Chul Han. Ele sugere, por meio de Nietzsche, uma pedagogia específica do ver, precisamos aprender a ver, “habituar o olho ao descanso, à paciência, ao deixar-se-aproximar-de-si”.
Por isso, finalizo com esta imagem de uma experiência pessoal artística do “qualquer dia dos 50 dias, um inventário do isolamento”.