O Movimento #vivacentroleste, formado por diversos cidadãos, frequentadores, trabalhadores ou moradores desta região da parte central de Florianópolis, torna público este manifesto que tem como objetivo alertar para a necessidade urgente de melhorias para a região. Ao contrário da narrativa que vem sendo construída pelo poder público que nos coloca como os ‘do contra’, sempre deixamos clara a nossa posição sobre a importância da requalificação da área. No entanto, a solução não é a retirada dos paralelepípedos históricos que estão ali desde 1886 e caracterizam o centro.
Ressaltamos o exemplo da intervenção na Alfândega, que prova como é possível um projeto conciliador, que melhorará a acessibilidade sem a retirada do pavimento centenário, enfatizando a necessidade de uso de materiais resistentes ao tráfego ao qual é destinado.
O setor leste foi o primeiro eixo de expansão da cidade, com suas ruas estreitas, ambiência histórica autêntica, com museus e circuitos artísticos, comércio, bares e restaurantes, feiras, e que reúne boa parte da economia criativa da cidade e vida cultural. Há mais de 20 anos o local não recebe manutenção nem melhorias, há problemas com o lixo, com as calçadas, drenagem, cabos elétricos que prejudicam a paisagem urbana e postes que atrapalham a acessibilidade. Nós do Movimento #vivacentroleste temos plena consciência da necessidade de melhorias no espaço que podem ser feitas com ações imediatas da prefeitura, depende somente de vontade política da atual gestão.
Em nenhum momento se contestou a necessidade de melhorias. Os questionamentos ao “Projeto de revitalização do centro leste” da PMF se referem ao confuso processo desde a concepção do projeto, omissão da autoria e da responsabilidade técnica por profissional arquiteto, uma exigência legal, a não apresentação pública à sociedade e a falta de debate, e outras irregularidades.
O projeto proposto pela prefeitura, caso seja executado, terá grande impacto para o patrimônio histórico e para a ambiência urbana do centro fundacional da cidade, setor tombado em nível municipal e também com bens protegidos em níveis estadual e federal. Várias versões do projeto foram divulgadas somente pela mídia tradicional sob o ponto de vista oficial, e já foram objeto de manifestações e pareceres contrários de órgãos e entidades ligados diretamente ao patrimônio histórico e à arquitetura e urbanismo e foram também analisadas pelo Ministério Público Estadual. Não houve debate sobre a versão licitada. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina, a partir de uma ação movida pelo Ministério Público, também decidiu que a Prefeitura tem que dialogar com Sephan, Iphan e Fundação Catarinense de Cultura.
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Em que pese a aparente iniciativa positiva da Prefeitura em investir no centro de Florianópolis, as diferentes versões do projeto desconsideram aspectos importantes do patrimônio cultural e da memória urbana da cidade, em flagrante oposição à sua necessária proteção pelo Estado. Assim como ocorria nas versões anteriores, a última apresentada pela Prefeitura em outubro de 2021 promove grande retirada dos pisos históricos de paralelepípedo e também daqueles de pedra portuguesa.
Também impactará negativamente sobre o turismo cultural, um ativo importante de desenvolvimento econômico, social e cultural da cidade, que tem como base a preservação dos elementos urbanos, além dos arquitetônicos. Chama a atenção também a inobservância das leis e decretos aplicáveis à intervenção nos âmbitos municipal, estadual e federal.
Vídeo realizado em contribuição à luta pelo Centro Histórico de Florianópolis. Narração: Osmarina Maria de Souza Texto, Imagens, Direção, Montagem: Cíntia Domit Bittar Música, som direto: Daniel Becker
Enfatizamos que a área é protegida por tombamento e pela legislação. O Decreto Municipal nº 190/90 em seu artigo 3º contempla o tombamento da malha viária urbana central compreendendo a Praça XV de Novembro, a rua Conselheiro Mafra e vias do setor Leste. Já a área do Centro Histórico também é tombada pelo Decreto 270/86. O Plano Diretor de Urbanismo do Município de Florianópolis (Lei Complementar nº 482/2014) apresenta proteções específicas sobre o conjunto da pavimentação e para os revestimentos antigos ou originais. Recorde-se ainda que, em 1991, a Prefeitura Municipal de Florianópolis foi objeto de uma Ação Civil Pública do Ministério Público do Estado para suspensão do asfaltamento projetado, sob argumento do tombamento das vias e seu consequente valor cultural, com autuação da PMF e decisão favorável, impedindo o referido asfaltamento. (Fonte: Relatório Técnico ACCR 01/2020).
Diversos representantes de órgãos e entidades ligadas ao patrimônio histórico e à arquitetura e urbanismo debateram intensamente o projeto para o Centro Leste na 4ª Reunião da Frente Parlamentar das Políticas Públicas Culturais em Florianópolis, realizada na Câmara de Vereadores e que também contou com participantes on-online em 26 de agosto de 2021. Os encaminhamentos resultantes da reunião apresentam questionamentos à versão do projeto que acompanhou a licitação para as obras no Centro Leste, como:
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A substituição de paralelepípedos por pavers contraria diversas leis e não foi submetida aos órgãos de patrimônio;
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O memorial do projeto licitado não apresenta análise urbanística;
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O memorial do projeto licitado não apresenta análise de patrimônio histórico – foi ressaltado que as inúmeras falhas e ambiguidades entre o projeto (desenho) e o memorial do projeto licitado dificultam análises precisas;
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Não há arquitetos como responsáveis técnicos (contraria a resolução 210 do Conselho de Arquitetura e Urbanismo).
O Movimento #vivacentroleste realizou diversas ações chamando a atenção para o projeto, inclusive uma reunião com o vice-prefeito Topázio Neto, na qual destacamos as mesmas questões presentes nesse manifesto e deixamos clara a dramática situação caso a obra iniciasse e fosse suspensa pela justiça.
É preciso esclarecer também que o projeto de “revitalização” proposto pela PMF e entidades próximas ao poder executivo, não trata apenas de melhorias para a região, mas de algo muito mais abrangente que na sua origem pretende excluir o que existe para dar lugar a outro público, as chamadas “pessoas de bem”, como tem circulado em colunas e documentos. “Revitalizar” pressupõe que não há vida no local, ao contrário, a região afetada pelo projeto é uma das mais ativas do centro histórico, com vida durante o dia e à noite.
O Movimento #vivacentroleste busca o apoio na defesa do interesse público, na adequada utilização dos recursos e, se for o caso, na apuração de fatos que demonstrem as irregularidades, considerando a ausência de discussão com a sociedade. A opinião pública mostrou majoritariamente, em diversas plataformas, sua posição contrária à retirada das pedras históricas de granito sem abrir mão das necessárias melhorias no Centro Leste. Foram mais de 1600 assinaturas de apoio ao abaixo assinado somente em dois dias, inúmeras manifestações nas redes sociais, enquete na mídia tradicional com 76% favorável à manutenção dos paralelepípedos, além de muitas vozes influentes na cidade que se somaram à defesa da história e da memória.
A requalificação do centro não deveria dividir a população, é uma ótima oportunidade de unir Prefeitura e Sociedade Civil na construção de um projeto mais qualificado para o Centro de Florianópolis. Em um passado recente, havia inclusive moradores que defenderam a demolição da Ponte Hercílio Luz, mas agora reabilitada, é inegável que virou nosso maior símbolo, e que teria sido trágico se as posições menos sensíveis com o patrimônio tivessem prevalecido naquele caso.
Os membros do Movimento #vivacentroleste assinam este manifesto.
Florianópolis, 19 de janeiro de 2022.