Para a geografia política, enclave é um território com distinções políticas, sociais e/ou culturais cujas
fronteiras geográficas ficam inteiramente dentro de outro território. Trata-se de um pequeno estado autônomo
envolvido dentro de outro. Enclaves são como claustros dentro de territórios alheios. Podem ter saída para o
mar, desde que estejam envoltos por este território que, se não lhe é estranho, não lhe é comum. A origem
de um enclave pode se dar por razões históricas, políticas ou mesmo geológicas: certas zonas tornaram-se
enclaves simplesmente por causa da mudança do leito de um rio. Ele pode ser também um exclave, caso
esteja vinculado legal ou politicamente a um outro território do qual não é fisicamente contíguo. O enclave é
uma espécie de zona autônoma e ao mesmo tempo terra reclusa que, ao passo que não dialoga com o
território ao seu redor tampouco dele pode se evadir. Um enclave, pode ser, assim, compreendido também
como um grupo de pessoas que vivem, pensam e atuam de forma diferente daquelas que vivem ao seu redor.
Em novembro de 2015, os artistas Marcelo Fialho e Marco D Julio iniciaram em sua residência-estúdio uma
série de encontros, os quais chamaram entropicais. Como conversas-experiência orientadas para o debate
que buscavam criar, a partir de uma palavra, uma fricção na maneira como compreendemos as relações
entre natureza e cultura, e arte e sociedade na contemporaneidade, eles estavam interessados em conversar
sobre o lugar onde vivem e com o qual buscam criar estratégias de convívio e afeto diários, Florianópolis.
Ao todo, foram 5 encontros ao longo de quase um ano: cada um ao redor de uma palavra (temática) e
contando com um grupo de não mais do que 6 participantes.
O EncontroEntropical#1, cujo tema era LENTO, buscou gerar um espaço de conversa sem pressa sobre arte
e como nos relacionamos e mudamos a experiência com o tempo. Ele aconteceu em novembro de 2015.
O EE#2, realizado um mês depois, contou com o título ARRANJO e teve como propósito conversar, refletir e
compartilhar incertezas sobre a noção de arranjo e seus múltiplos e contraditórios sentidos quando
produzimos conhecimento.
O EE#3, realizado em março de 2016, chamou-se MESTIÇO e buscou se concentrar nas transversalidades culturais e epistemológicas que este termo funda – tão essenciais à compreensão e produção de arte e conhecimento na contemporaneidade.
O EE#4, realizado em junho passado, contou com o título-tema AVESSO e consistiu numa conversa sobre o dorso, o reverso da nossa compreensão sobre o que seja arte, loucura, território e política. Deslocamo-nos diante e por baixo dos termos, desconfiando da ordem das coisas, buscando ver o mundo desde e pelo seu verso.
O EE#5, realizado em agosto último, girou sobre ESCUTA com o intuito de conversar sobre o que esta palavra anuncia e esconde, sobre as perspectivas simbólicas e também políticas que ela engendra; ao fim e ao cabo,
experimentar e debater, num ambiente de conversa informal, as relações poéticas e cotidianas que temos
com a escuta, e portanto com o silêncio.
O EE#6. O primeiro, inteiramente público e expandido no tempo – terá a duração de duas semanas.
E não podia ser diferente, tampouco ter outro título. Enclave consiste ao mesmo tempo no desterrar dos
encontros até então organizados como zonas autônomas dentro da casa de Marcelo e Marco, e no seu
amadurecimento e partilha como um território político-poético de conversa dentro de uma galeria. Não há
obras. Não há exposição. Há palavras, vozes, espaço de conversa e uma floresta. Registros sonoros dos
encontros entropicais irão compor este novo território a fim de somarem-se aos novos tempos e falas que
deverão eclodir deste novo lugar localizado numa galeria de uma instituição de arte localizada num prédio
público situado no centro da cidade de Florianópolis. Florianópolis que é uma ilha. O enclave está feito.
Agora, é preciso conversá-lo.
De acordo com a curadora Mônica Hoff, “se antes o foco dos encontros entropicais estava na
desinstitucionalização da arte e seus processos e na possibilidade de pensá-los em termos micropolíticos e
quase silenciosos, em ENCLAVE a ideia é imaginarmos e esboçarmos coletivamente as zonas e territórios
onde queremos estar e viver, tentando entender e reinventar as camadas de territórios que nos contêm e que,
ao mesmo tempo, nos dão sentido”. “O Enclave marca a transição do projeto, até então circunscrito por
afetamentos íntimos, particulares e, assim, algo reservados para a esfera pública, ampliando as ativações
entrópicas que os encontros podem produzir”, acreditam Marco e Marcelo.
Essas são as linhas gerais do projeto ENCLAVE que aporta, no próximo dia 15 de setembro, na galeria do
Memorial Meyer Filho, às 18h30, como uma grande e estendida conversa pública. No dia da abertura os
artistas, juntamente com os participantes dos encontros anteriores, rodeados de uma floresta, vozes e
palavras, darão início a esta conversa aberta. A proposta foi selecionada na Chamada de Projetos 2016 do
Instituto Meyer Filho.
O projeto contempla ainda uma peça sonora (com as conversas realizadas) e uma publicação que deverão
ser lançadas no mês de outubro.
Este texto foi escrito a seis mãos: Marcelo Fialho, Marco D Julio e Mônica Hoff.
Serviço:
Exposição: Enclave
Artistas: Marcelo Fialho e Marco D Julio
Curadoria: Mônica Hoff
Local: Memorial Meyer Filho, Pça XV de Novembro, 180, Centro, Florianópolis
Horário de funcionamento: Terça a sexta-feira, das 13h às 19h.
Abertura: 15 de setembro de 2016 às 18h30
Visitação: de 16 a 30 de setembro de 2016 (finissage às 19h)
Artistas – Marcelo Fialho + Marco D.Julio
Artistas, trabalham juntos há mais de uma década. Começaram em Fortaleza, onde residiram até 2010, com
uma pesquisa que colocava em contato campos como o design, a arte e a saúde mental. Desde 2012
vivendo em Florianópolis, atualmente, seu campo de interesse está focado na ocupação e intervenção. Neste
período criaram o coletivo o tropicalista que consiste em um laboratório de pesquisa, experimentação e
realização de projetos transdisciplinares realizados a partir de investigações feitas pelos artistas em
caminhadas e percursos realizados no tecido urbano e nos ambientes naturais da cidade onde vivem. Dentre
os projetos realizados estão os Encontros Entropicais (http://encontrosentropicais.tumblr.com/) e Jungle
(http://otropicalista.com.br) .
Curadoria – Mônica Hoff
Artista, curadora e pesquisadora. Mestre em História, Teoria e Crítica de Arte pela Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, atualmente cursa doutorado em Processos Artísticos Contemporâneos no
PPGAV/UDESC. De 2006 a 2014, coordenou o projeto pedagógico da Bienal do Mercosul, atuando também
como curadora de base e coordenadora do Programa Redes de Formação da nona edição do evento, em
2013. No período, organizou três publicações: Pedagogia no Campo Expandido, com Pablo Helguera, em
2011; e A Nuvem e Manual para curiosos, com Sofía Hernandez Chong Cuy, em 2013. Desde 2014, realiza,
em parceria com a curadora Fernanda Albuquerque, o Laboratório de Curadoria, Arte e Educação em
diferentes cidades brasileiras, e prepara para 2016 três outros projetos: Escola de Surf-etc; Trabalhos
domésticos, com a curadora e pesquisadora Valquíria Prates; e Escola Extraordinária, com a curadora
Kamilla Nunes. Nos últimos anos têm colaborado com projetos e instituições nacionais e internacionais como
Matadero Madrid, Museo Picasso Málaga, Liverpool Biennial, Colección Cisneros, New Museum/NY, Casa
Daros, Instituto MESA, De Appel Arts Centre, NC-Arte, Alumnos 47, Bienal de São Paulo, Bienal de Cuenca,
entre outros.