A artista blumenauense Elke Hering (1940-1994) desenhista, pintora, gravadora e escultora, ao morrer aos 53 anos, deixa trabalhos que exercem até hoje uma força difícil de dimensionar, porque raramente reunidos em retrospectiva. Os tecidos sociais, os efeitos dos paradigmas patriarcais explicam um certo apagamento desta produção que, agora, a pesquisadora Denise Mattar apresenta com vitalidade na exposição “Elke Hering – Metamorfoses”, que abre no dia 20 de julho, das 13h30 às 18h30, no Instituto Collaço Paulo – Centro de Arte e Educação, em Florianópolis (SC). A iniciativa dá visibilidade pela primeira vez na instituição à arte feminina e marca o primeiro ano do espaço inaugurado em 31 de julho de 2022.
Um novo ciclo vem como proposição do Núcleo Educativo, em favor da qualificação do atendimento, com a mudança de horário dos sábados que passa a ser entre 10h30 e 15h30. O Núcleo Educativo está mobilizado para atender os inúmeros pedidos de escolas públicas e privadas, bem como de representantes do terceiro setor (organizações não-governamentais), interessados na promoção da arte em favor da sensibilização e da amplitude do conhecimento em torno das exposições. Com apoio do Serviço Social da Indústria (Sesi), apoio cultural da Ibagy e patrocínio da Prefeitura de Florianópolis por meio da Lei Municipal de Incentivo à Cultura, o Instituto Collaço Paulo viabiliza o transporte para grupos de estudantes da rede pública municipal participarem das ações educativas com visitas mediadas e práticas imersivas.
Outra meta melhor delineada é a construção de conteúdos auxiliares ao percurso expositivo, previstos para estrearem após a abertura da exposição, uma série de vídeos com audiodescrição e tradução em libras e visitas mediadas em libras. Carolina Rögelin é a arte educadora e intérprete que constrói com a equipe do educativo os materiais e também realizará uma visita mediada em libras, no dia 20 de julho, entre 15h e 16h. Duas outras visitas com a educadora estão agendadas para setembro e novembro próximos.
“Elke Hering – Metamorfoses”, sem caráter retrospectivo, propõe uma nova demarcação analítica em torno das obras desta mulher audaciosa que rompe com paradigmas num universo pouco sensível à criação vanguardista que mantém diálogo com as expressões artísticas e intelectuais do seu tempo. Mattar conta com a consultoria da pesquisadora Daiana Schvartz.
A vasta experiência da curadora, com conhecimento do modernismo brasileiro e um currículo que inclui atividades nas principais instituições do Brasil, possibilitam uma oportunidade única de análise e legitimidade. A mostra reúne 75 trabalhos, apresentados em sete núcleos – A Descoberta – 1956/57, Tempos Difíceis – Alemanha – 1958/60, Novos Ares – Bahia – 1962/63, Alemanha Outra Vez – 1966/67, Pop Art – 1968/75, Corpos e Fragmentos – 1978 /86 e Luz! – 1986/94. Além de um expressivo conjunto de esculturas, desenhos, aquarelas e pinturas em diferentes técnicas, a exposição, segundo Denise Mattar, demonstra o quanto vida e personalidade estão associadas, em permanente movimento, “entre força e fragilidade, de beleza e dureza, de frieza e calor. Na sua produção escultórica alternam-se o ferro duro e retorcido, com a pele plástica e colorida sobre volumes macios, a organicidade da madeira, com a rigidez do cimento, os corpos fragmentados de bronze, com o brilho e o mistério do cristal”.
No conjunto dos trabalhos, criados entre 1956 e 1994 no Brasil, nos Estados Unidos e na Alemanha, a poética de Elke envolve representações em que o corpo ocupa uma centralidade. Boa parte de suas imagens evocam o corpo como expressão de um lugar ou de um sujeito, no caso, apontam para uma base de autoconhecimento, de busca de identidade, ou seja, a construção de si mesma diante dos embates existenciais. Trata-se, portanto, não de um ativismo pró-feminista, mas sim de obras que friccionam a própria alteridade, associadas à pesquisa constante sobre as correntes artísticas do seu tempo. A exposição é elucidativa sob o ponto de vista biográfico, demonstra os percursos geográficos e resultado de suas experiências transnacionais. Sobressaem nesta trajetória o pleno domínio do desenho, do sentido da cor, da forma e do espaço, atributos que se concretizam numa produção que se faz conhecer melhor na exposição do Instituto Collaço Paulo.
Entre algumas curiosidades da mostra estão “Tinteiro”, realizada em 1972 com plavinil, uma fase que remete à arte pop e, pelas cores, ao modernismo brasileiro, seis pequenas esculturas em cristal, e a rara escultura “Figura No 1”, que integrou o 22º Salão Paranaense que está no núcleo Novos Ares, do período em que a artista esteve na Bahia nos anos 1960. No uso do mármore, do ferro, do plavinil, da madeira, do bronze, do chumbo, do cristal, das tintas – não importa a materialidade, o certo é que a exposição oferece uma inédita oportunidade para conhecer o segundo núcleo de arte catarinense mais importante da Coleção Collaço Paulo, que dá sentido social ao Instituto Collaço Paulo – Centro de Arte e Educação.
A curadora Denise Mattar, que vive em São Paulo, põe sua expertise para instaurar um outro pensamento sobre Elke Hering, alinhando vida, obra e trajetória dentro do circuito de arte brasileira. A exposição certamente surpreenderá os visitantes. O resultado da pesquisa curatorial, conceitos, expografia e montagem apontam a consistência de um conjunto de trabalhos que se abrem para reflexões sobre a arte no plasma da alteridade feminina – um tema caro nos dias atuais.
o fim do ano, o Instituto Collaço Paulo – Centro de Arte e Educação promove uma série de atividades, entre eles os programas Instituto Conversa, Retroprojetor: Encontros do Olhar, Sábados com Arte e Instituto Entrevista, que consiste em conversas publicadas no site da instituição. No dia 20 de julho, às 19h, Denise Mattar é a convidada do Instituto Conversa e falará sobre o percurso curatorial da exposição “Elke Hering – Metamorfoses”. No dia 31 de julho, entre 19h30 se 21h o professor e pesquisador Raul Antelo faz mais uma conferência no programa Retroprojetor: Encontros do Olhar, quando aborda “A Eterna Ironia da Comunidade: Arte Normal, Anormal, Degenerada”. Já o primeiro Sábados com Arte, ocorre no dia 5 de agosto, das 10h30 às 11h30. Com entrada gratuita, os programas são abertos a comunidade.
Sobre Elke Hering (1940-1994) – Breve biografia
Escultora, pintora, desenhista e gravadora. Nasce e morre em Blumenau, onde também começa seus primeiros estudos artísticos em 1957. Entre 1958 e 1960, estuda na Academia de Belas Artes de Munique, Alemanha, onde tem como professor Anton Hiller (1893-1985) e recebe menção honrosa. Ao voltar para o Brasil decide, em 1962, estudar escultura em Salvador (BA), com Mário Cravo Jr. (1923-2013). Em 1965, conquista o primeiro prêmio de escultura, no 1º Salão Pró-Arte Nova de Blumenau e no Salão Paranaense de Belas Artes, Curitiba (PR). Em 1966, retorna a Munique.
Em 1970, com o marido, o poeta Lindolf Bell (1938-1998), funda a Galeria Açu-açu, espaço emblemático no campo da cultura da cidade e de Santa Catarina, porque resulta como um ponto irradiador de produção de saber sobretudo nas artes visuais e na poesia, projetando novas carreiras artísticas. Elke deve ser pensada também como alguém que ativa inúmeros encontros, reflexões e debates que estimulam jovens criadores.
Em 1984, inaugura o Ateliê Elke Hering, onde dá vazão ao seu refinado pensamento estético e estrutura uma carreira de êxito nacional e internacional. Participa dos mais importantes certames de artes visuais, em mostras individuais e coletivas, realizadas em São Paulo (SP), no Rio de Janeiro (RJ), Curitiba, entre outras cidades. Ao morrer, em 1994, deixa um valioso legado. Um expressivo volume de trabalhos – desenhos, pinturas e esculturas – hoje integra a Coleção Collaço Paulo.
Sobre Denise Mattar
Curadora do Museu da Casa Brasileira (1985/87), do Museu de Arte Moderna de São Paulo (1987/89), ambos em São Paulo, e do Museu de Arte Moderna (1990/97), no Rio de Janeiro. Como curadora independente realizou mostras de artistas como Di Cavalcanti (1897-1976), Flávio de Carvalho (1899-1973), Ismael Nery (1900-1934), Pancetti (1902-1958), Iberê Camargo (1914-1994), Sacilotto (1924-2003), Anita Malfatti (1889-1964), Samson Flexor (1907-1971), Portinari (1903-1962), Alfredo Volpi (1896-1988), Guignard (1896-1962), Yutaka Toyota, algumas das quais premiadas pela Associação Brasileira de Críticos de Arte (ABCA) e Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA).
Sobre o Instituto Collaço Paulo – Centro de Arte e Educação
Uma coleção de arte carrega conexões profundas entre o passado, o presente e o futuro. Complexo, o colecionismo pode ser um pilar de atuação na busca de conhecimento em diferentes áreas do saber e, assim, transformar realidades socioeducativas. Com essa convicção, o Instituto Collaço Paulo – Centro de Arte e Educação, entidade sem fins lucrativos fundada em 2022, se associa à história artística e cultural de Florianópolis. A Coleção Collaço Paulo, de Jeanine e Marcelo Collaço Paulo, tem a missão de compartilhar e promover a arte sobretudo por meio de exposições e de programas de cunho educativo voltados à comunidade.
Serviço
O quê: exposição Elke Hering
Quando: 20.7.2023 a 2.12.2023; seg. a sex., 13h30 às 18h30, sáb., 10h30 às 15h30
Onde: Instituto Collaço Paulo – Centro de Arte e Educação, rua Des. Pedro Silva, 2.568, bairro Coqueiros, Florianópolis (SC)
Quanto: gratuito
Fonte: assessoria de imprensa do Instituto Collaço Paulo.