Estamos vivendo num período de transição da era industrial para a era do conhecimento, onde criatividade, capital intelectual, conectividade e inovação estão transformando nosso estilo de vida e revitalizando a economia mundial. Frente a esta nova realidade, estamos mudando nossos hábitos e a maneira como vivemos, estudamos, trabalhamos e nos relacionamos. Neste contexto de profundas mudanças estruturais, surge a economia criativa como um novo conceito voltado para à dinâmica de transformar ideias em bens ou serviços dotados de conteúdo criativo, valor cultural e comercial. Através da economia criativa passamos a entender melhor complexas interações entre os aspectos econômicos, culturais, tecnológicos, sociais e ambientais que estão dando novos rumos à vida da sociedade contemporânea.
Em um mundo cada vez mais repleto de imagens, sons, textos e símbolos, a economia criativa se impõe como vetor de crescimento econômico, empregos, comércio, diversidade cultural e inclusão social[1]. Trata-se de uma área abrangente em que as indústrias criativas englobam desde o patrimônio cultural, as artes e a mídia até os setores mais intensivos em tecnologia e serviços tais como o design e suas diversas facetas: arquitetura, design de interior, design gráfico, moda, joias e brinquedos. Além de considerações de estética, formas, especificações e processos, o conceito de design passa a incorporar a noção de produto criativo funcional.
Muito mais do que seu inestimável valor cultural, o setor criativo representa grandes negócios e divisas. Durante a última década o comércio internacional de bens e serviços criativos teve uma taxa anual de crescimento de 9%, movimentando anualmente mais de 624 bilhões de dólares[2]. Design é o setor que mais contribui para o mercado mundial de produtos criativos, representando 65 % das exportações mundiais de bens criativos, ou seja cerca de 300 bilhões de dólares. Arquitetura e serviços de design correlacionados incluindo decoração, é o setor criativo que mais se destaca e mesmo durante a crise econômica mundial, as exportações mundiais de serviços de design excedeu 80 bilhões de dólares em 2008.
O Brasil, apesar da abundância de talentos, tem intensidade criativa baixa, oferta limitada e as atividades criativas estão concentradas nas grandes cidades. O país tem participação tímida no mercado mundial e atualmente exporta somente 7,4 bilhões de dólares de produtos criativos. Precisamos reforçar a capacidade criativa da nova geração e estimular à criatividade não só no campo artístico e cultural, mas também na ciência, na tecnologia, nos negócios e nos setores de ponta da fase pós-industrial. Nosso país tem vasto potencial para ativar e melhor se beneficiar de sua economia criativa, mas precisamos não só de políticas públicas concertadas e mais ousadas, como também de visão estratégica de longo prazo. A partir daí, teremos condições de inovar e criar bases sólidas para um desenvolvimento mais inclusivo e sustentável no país[3].
Recentemente, tem-se observado um grande interesse por parte dos governos de cidades e municípios, inclusive no Brasil, pelo conceito das “cidades criativas”. O objetivo é reformular políticas urbanas no sentido de revigorar a vida cultural, social e recreativa das cidades afim de estimular crescimento socioeconômico e atrair investimentos, turismo e a chamada classe criativa. Neste esquema práticas de economia criativa se desenvolvem em paralelo a transição rumo à economia verde e o design urbano de futuras cidades inteligentes. Debates interessantes ocorreram durante a IV Bienal Ibero-Americana de Design realizada em Madrid, Espanha (25-29 novembro 2014).
A abordagem mais ampla de design também tem sido usada para adaptar cidades e ajudá-las a enfrentar novos desafios demográficos, sociais e ambientais do século XXI. A ideia é oferecer uma melhor qualidade de vida a seus habitantes, e encontrar soluções inovadoras para lidar com os problemas quotidianos dos grandes centros urbanos tais como trânsito, poluição, segurança, delinquência etc. A cidade de Medellín na Colômbia é um caso de sucesso e foi eleita a Cidade Inovadora de 2013, pois através de urbanismo e intervenções arquitetônicas modernas tais como o Parque Explora, foi capaz de mudar a imagem da cidade criando espaços culturais e tecnológicos de excelência em uma zona pobre, facilitando assim o processo de inclusão e tendo como impacto positivo a redução da pobreza e criminalidade.
Igualmente com o intuito de incitar ações e projetos que usam o design para melhorar o bem estar social e encorajar a articulação de políticas urbanas, o Conselho Internacional de Sociedades de Desenho Industrial (ICSID – International Council of Societies of Industrial Design) instituiu a designação bianual “Capital Mundial do Design”. Em 2014, a Capital Mundial do Design foi a Cidade do Cabo na Éfrica do Sul, que formulou mais de 460 projetos sob o tema “Design Live ” que visam a transformação econômica, social e cultural da cidade. Uma série de eventos estimularam arte e criatividade através da arquitetura, design de interior, gastronomia, moda, joias e artesanato criados ao redor do tema “Beautiful space – beautiful things”. A realização de um congresso e uma exposição internacional de design e a formulação de uma política de design para a cidade mereceram destaque. Além do mais, as autoridades locais aprovaram a Política para Artes, Cultura e Indústrias Criativas posicionando a Cidade do Cabo como centro de excelência criativa da África do Sul. A cidade eleita para 2016 é Taipei em Taiwan, na China.
[1] United Nations, UNCTAD/UNDP (2008) Creative Economy Report – 2008 [2] UNCTAD - Creative Economy Global Database [3] Dos Santos-Duisenberg, Edna (2013): Tempo livre, lazer e economia criativa, Revista Inteligência Empresarial, N° 37, COPPE, Universidade Federal do Rio de Janeiro
- Artigo publicado no anuário ArqSC 7ª edição.
Edna dos Santos-Duisenberg – Economista, assessora internacional na área da economia criativa e políticas de desenvolvimento. Atualmente é Conselheira do Instituto da ONU para Treinamento e Pesquisa (UNITAR, Genebra) e Vice-Presidente da Federação Internacional das Associações de Multimedia (FIAM, Montreal).